ALADIM DOS CAPRICHOS IMPOSSÍVEIS
O ansioso não é ansioso por ele, mas pelos outros.
A ansiedade é raciocinar pelos outros, é concluir pelos outros, é resolver pelos outros.
Você escuta algo, toma aquilo como uma missão e deseja concluir rapidamente para voltar a pensar em si.
A ansiedade é uma generosidade inventada pelo egoísmo.
A ansiedade é correr contra o tempo com o propósito de voltar a ter seu próprio tempo.
A ansiedade é a compulsão de atender às expectativas de quem está do seu lado para retornar aos cuidados de suas próprias expectativas.
O dilema do ansioso é que procura agradar à sua companhia para não ser criticado. Mas sempre está a fim de algo pessoal que não sobra tempo.
É alguém que come o pior do prato e reserva o melhor para o final. Certamente a comida predileta restará fria na hora de ser garfada.
Não há discernimento entre o que é importante e o dispensável. Tudo é urgente, tudo é motivo de aflição, tudo é uma perigosa avaliação de seus atos.
A próxima atividade, apenas por ser a próxima, é de absoluta premência. O pequeno e o grande têm o mesmo valor. O simples e o épico têm igual medida.
O problema do ansioso é que ele converte qualquer solicitação em prioridade. E como só consegue começar uma tarefa quando terminar a anterior, sua rotina transforma-se em gincana.
Ninguém está pedindo ou solicitando nada, só que ele se posiciona como o provedor do universo, como o telepata do casamento, como o Aladim dos caprichos impossíveis.
Como se fosse um marido saciando infinitamente os rompantes esquisitos de sua esposa gestante. E sua esposa ainda nem está grávida.
O ansioso é carente, pois nunca se julga satisfeito consigo.
O ansioso é insaciável, pois não para nem para comemorar seus feitos.
O ansioso não avalia as possibilidades, ele prefere descartá-las cumprindo uma por uma.
Se a mulher comenta que precisam comprar roupa de cama, incorpora as palavras dela como uma ameaça e pretende amanhecer na loja e se desobrigar da tarefa.
Mas ela não falou para realizar naquele instante, era uma intenção para ser cumprida durante o mês, mas o mês para o ansioso é ontem e ele não admite esperar. Ele não suporta acumular planos. Plano é tensão, plano é pendência, plano é uma decepção agendada.
Parte da hipótese de que senão fizer agora não fará nunca mais. Mas é mentira. Ele faz rapidamente porque odeia ter compromissos em aberto. Abomina ser pressionado e se pressiona terrivelmente. Ele se cobra para não ser cobrado.
Seu prazer está em finalizar os atos, não em desfrutá-los. Perde o melhor da vida que é não se preocupar naquilo que virá depois.
O ansioso é um doente terminal com excesso de saúde. Morre de uma doença imaginária.
Publicado no jornal Zero Hora
Revista Donna, p.32
Porto Alegre (RS), 07/06 /2015 Edição N°18186