AMOR PARCELADO
Arte de Marc Chagall
Nunca segui a ordem natural das coisas: eu já casei no segundo dia, noivei com dois anos de relação e hoje estou namorando a esposa.
Fiquei com a minha mulher desde a primeira noite e não desgrudei mais. Não consegui sair de perto. Fracassei ao abrir a porta, mas abri todas as janelas. Arejei minha cabeça.
Fiquei com a minha mulher desde a primeira noite e não desgrudei mais. Não consegui sair de perto. Fracassei ao abrir a porta, mas abri todas as janelas. Arejei minha cabeça.
Ela é um vício que só me deu virtudes.
Respeito os casais tradicionais, que namoram primeiro, em seguida realizam o noivado e, após um bom tempo, sobem ao altar. Trocam a aliança da mão direita para a esquerda devagar e só casam com a residência pronta, totalmente mobiliada, com conta no azul, sem riscos de sofrimento.
Mas eu sou do segundo time. Eu caso para depois ver o que fazer. Caso sem nada dentro da residência. Dependo apenas de um colchão no chão e da mesa dos joelhos para apoiar o prato.
É somar as pobrezas e brincar com as dificuldades.
É começar retirando os rótulos do copo de requeijão até desempacotar cálices de cristal.
Um ajudando o outro, um fortalecendo o outro.
É lindo o relacionamento que não usa desculpas e adiamentos. Vai de qualquer jeito.
É lindo festejar - pouco a pouco - cada compra. Comemorar os pequenos aumentos.
Lembro quando compramos o armário do quarto e dividimos os espaços das gavetas.
Lembro quando compramos a televisão 39 polegadas e atravessamos a madrugada assistindo filmes com pipoca.
Lembro quando compramos um carro e ninguém queria ser o primeiro a dirigir com medo de bater.
Lembro de tudo o que tem em casa, como foi, onde foi, e o que significa.
Meu amor é parcelado. As parcelas de meu amor são infinitas.
Ouça meu comentário na manhã de terça-feira (31/7) na Rádio Gaúcha, programa Gaúcha Hoje, apresentado por Antonio Carlos Macedo e Daniel Scola: