AS MULHERES E UM ESPORTE PECULIAR
Foto: Diego Vara
A mulher transforma a decadência do homem em esporte. Poderia ter uma Olimpíada toda particular para modalidades inusitadas pelas mãos femininas.
Dividiria em três grandes competições, um triatlo doméstico: espremer espinhas, catar pelos brancos e varrer as orelhas. Nenhuma mulher resiste a escarafunchar as vergonhas de seus parceiros. O que eles gostariam de esconder, elas têm um sádico orgulho de mexer.
Se fico de costas na cama, relaxado, sem camisa, lendo um livro, a minha esposa, disfarçada de carinho, logo insinua uma massagem nos ombros, mas está carregada do maquiavélico interesse para estourar as minhas espinhas. E é um vicio, explode uma, ri satisfeita da competência do trabalho e já parte para a próxima, não consegue parar, não escuta a sinceridade de minha recusa, entra na fixação infantil do plástico-bolha, apenas sairá dali carregada por seguranças.
Se fico de frente na cama, lendo a mesma página pela enésima vez, a minha esposa avança com a cabeça para derrubar a obra e encaixar a cabeça no colo. Acho fofo e deixo, não há como se defender de ronronadas. Mas é só me distrair que – ui! – ela começa a arrancar seletos pelos grisalhos de meu peito. Encontra um, endoidece para rastrear outros e não para mais, como uma pac-woman comendo pastilhas, apenas sairá dali engolida pelos fantasmas.
Se deito de lado, para recomeçar o livro empacado há semanas, a minha esposa se aproxima, absolutamente dengosa, e sopra juras eternas. Seguro o arrepio e me sinto o homem mais feliz do mundo. É bobear que ela está com a lanterna do celular consultando o meu canal auricular, com claras pretensões de tímpano. Verifica uma sujeirinha e se anima a cutucar, e não para mais, apenas sairá dali com uma diploma de medicina.
É óbvio que desisto de ler deitado, mas agora unicamente sentado, de preferência em uma poltrona sem encosto.
Nenhuma guerra, nenhuma discussão será capaz de cancelar a competição. Sua curiosidade cresce com a resistência. As medalhas de minha mulher são feitas de meu sorriso amarelo.
Publicado em Donna em 17/04/17