Blog do Carpinejar

ATÉ O FIM


Arte de Eduardo Nasi

Nunca toque numa mulher por tédio. Nunca toque uma mulher por tocar. Nunca toque uma mulher para completar uma palavra ou ocupar um silêncio.

Nunca toque para apoiar os medos, cobrir mágoas, equilibrar a nudez.

Nunca toque uma mulher por vingança, por carência, por controle.

Não toque se não pode andar na imaginação, se não tem vontade de segurar sua mão enquanto arde, de emparedar a respiração com os olhos.

Não toque se não está disposto a sofrer, se não está disposto a curar o sofrimento.

Nunca toque uma mulher por imprecisa hospedagem, para breve visita das pálpebras.

Toque se quiser morar, se quiser naufragar pelas janelas, se quiser morrer de ansiedade.

Não toque se não deseja, se não assumiu a ponta dos lábios nos dedos.

Não acorde o corpo de uma mulher se não irá acalmá-lo depois. Não importune a mulher se não sonha em laminar o rosto em sua pele.

Não convoque os seios para despistá-los. Não prenda a cintura se não mergulhará no cheiro.

O toque é uma promessa. Não se esvazie na repetição.

Não toque se resta dúvida, não toque se vem desistindo da relação.

Não toque uma mulher por luxo, para experimentar uma fantasia, para justificar uma ideia.

Não toque uma mulher porque não tem nada a fazer, se pensava em outro lugar.

Não toque uma mulher por vaidade, para testá-la.

Não toque para apenas para se deleitar com o prazer do suspiro, pela glória de vê-la excitada.

Não toque uma mulher à toa, por brincadeira, por maldade.

Não desonre a suavidade com a falta de firmeza.

Não toque se não precisa, se não tem urgência. Até a preguiça tem urgência.

Não toque se não ficará mais tempo, se não pode conversar, se não há como gemer.

Não se sinta melhor do que o tato.

Não se aproxime se não busca deitar. Não deite se não busca acordar. Não mexa se não tem como enlouquecer.

Não finja que não chamou, não minta que não ouviu.

Não simule pergunta para fugir da resposta.

Não menospreze a frustração.

Não cumprimente se não abraçar, não abrace se não roçar.

Não toque numa mulher por obrigação, para mostrar virilidade. Não a incomode com os beijos se não pretender soprar os ouvidos.

Não desperte as contradições, os tremores, se não pretende seguir adiante.

Nunca provoque uma mulher se não vai comê-la.





Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira

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