BONECO INFLÁVEL
Arte de Eduardo Nasi
Se o homem lhe ama não mudará o rosto depois do sexo. Não mudará de atitude.
Não ficará com vontade de fugir da cama, não se sentirá incomodado pela intimidade e pressionado pela madrugada, não lembrará de nenhum compromisso da manhã seguinte, não sairá da cama à caça das roupas e do celular.
Se o homem lhe ama, ele é igual antes e depois do sexo. Exatamente igual. Não usará da educação para se distanciar. Não formulará nenhuma pergunta sobre o tempo. Não escolherá as palavras mais neutras. Poderá convidá-la para tomar um banho junto ou comer algo na cozinha (quer melhor cena do que o casal apaixonado rindo e cozinhando pelado?). Certo é que não arredará o pé dali sozinho, sob hipótese alguma.
Já quando procura somente sexo, são visíveis os sinais. É como um despertar de transe, de uma hipnose. Ele tem a língua cortada pelo fim do prazer. Não difere muito de um boneco inflável, inflado de poder e potência na véspera, esvaziado e culpado após o orgasmo.
As mulheres não dependem de nenhuma astúcia para resolver a charada. Basta comparar quem começou a transa e aquele que restou no quarto.
Como que o sujeito passional, pedindo tudo para ontem, com ânsia de tirar seu sutiã, soprando safadezas sem precedentes nos ouvidos, não suportando um minuto longe de suas pernas, desliga-se de qualquer aproximação e é capaz de dar agora um descarado e sem sal beijo na bochecha?
Se o homem lhe ama, demonstrará apego, oferecerá o peito para sua cabeça, segurará sua mão, alisará os cabelos, continuará beijando na boca, comentará algo engraçado para distrair a seriedade daquele momento.
Se o homem lhe ama permanecerá perto, respirando longamente a falta de ar.
Completamente dispensável o telefonema do dia seguinte para definir se é ou não é amor. Quando o homem lhe ama, torna-se óbvio, redundante, até piegas, deseja ainda agradar mesmo saciado.
Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira 01/07/2015