Blog do Carpinejar

CASINHA PARA OS PAIS

Tenho inveja dos jogadores de futebol. Logo que assinam o primeiro contrato profissional com um grande time, o pontapé inicial do mundo adulto é comprar uma casa para a mãe. O maior interesse deles é resolver a vida dos pais, realizar o sonho da velhice feliz.

Para quem se manteve com pouco, no pouco, na economia de se virar em muitos para juntar o básico no mês, o nome na certidão de registro de imóvel é a verdadeira certidão de nascimento.

Algumas pessoas realmente nascem com a casa própria - vem um alívio de ter finalmente o seu cantinho depois de viver emprestado e de favor toda a trajetória.

Os jogadores entendem o valor desse ideal. Apesar do deslumbramento adolescente com o sucesso, não pensam egoisticamente, não se esbaldam em gastança para o seu benefício, buscam retribuir, antes de tudo, os sacrifícios e renúncias de sua senhora. A prioridade é a mãe, depois que vão caçar um lugar para si. Anseiam pela benção das suas santas, agradecendo as madrugadas viradas e as marmitas das viagens aos treinos.

Acabo chorando com o choro materno diante da loteria do filho. Com o beijo do marmanjo na testa suada de sua velha. Controlo as lágrimas dos olhos, porém elas são caprichosas e insistem em escapar pela boca.

Não importa que seja clichê, o clichê pode ser tão verdadeiro.

O que me dói, por outro lado, é perceber tantos filhos com condições, bem resolvidos financeiramente, esclarecidos intelectualmente, com carreiras sólidas e de projeção, que abandonam os próprios pais à sorte.

Nem é o caso do gesto grandiloquente de oferecer uma residência, mas pelo menos deveriam separar um quartinho para os seus protetores. Só que nem isso, sequer planejam um espaço mínimo em sua casa, um espaço com nome e sobrenome, para eles se sentirem à vontade e acolhidos.

Fazem a maior diferença as gavetas vazias para colocar as roupas da mala, fazem a maior diferença os lençóis cheirosos e a toalha dobrada na cama, fazem a maior diferença a véspera e ser desejado.

Simplesmente os filhos abrem o sofá da sala, como que dizendo que os pais são hóspedes do amor, que devem pernoitar e jamais permanecer.

Crônica publicada em 20/6/2018

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