CIDADE DOS ETs
Responsável por museu, o historiador diz ter sido “recrutado” por entidade.Fotos de Jean Scharwz
Na dúvida, o réu é absolvido. Na incerteza, o extraterrestre existe. A frase de São Tomé não funciona na pequena Itaara, cidade localizada na região central do Estado, a 257 quilômetros da capital gaúcha. A sentença é inversa: acredita-se enquanto não se enxerga.
O lema é duvidar para crer.
– Olha, nunca vi, mas existe – expõe Rodrigo Cauduro, 35 anos.
Os 5 mil moradores não menosprezam as galáxias distantes. Tampouco o assunto provoca pavor.
– Os terráqueos têm o egoísmo de achar que são os únicos seres – explica a estudante Joice Abreu, 27 anos.
– Se eu estivesse sentado na varanda e viesse um óvni no pátio, desde que não estragasse minha grama, ofereceria um chimarrão ao alienígena – antecipa o aposentado Nelson de Oliveira Rosa, 60 anos.
Itaara tornou-se a cidade dos ETs após virar sede do primeiro e único Museu Internacional de Ufologia na América Latina, que completou 10 anos em junho e já contabiliza 180 mil visitantes.
A fortificação azul se assemelha a um disco voador pousado numa área rural, em meio a estradas tortas de barro e terrenos baldios. A dificuldade em chegar ao local aumenta a curiosidade. O museu é dirigido pelo historiador Hernan Mostajo, 44 anos, e sua mulher Roberta Ávila, 40, juntos há duas décadas, e foi batizado curiosamente de Victor Mostajo. O filho adolescente do casal, que estuda e mora em Santa Maria, empresta o nome ao lugar.
– Homenageamos os vivos e o futuro, não os mortos e o passado.
Hernan estufa o peito como um tenor para guiar a visita. Seus olhos negros nervosos criam suspense na hora de falar. Suas pálpebras tremem sem querer e ajudam a adrenalina da oratória. Ele não esclarece dúvidas, dá palestra em toda resposta. Foge de questões objetivas e pessoais devolvendo novas questões. Diz ter sido recrutado por uma entidade em Ibirubá, em 1993. Na época, recebeu de presente fragmento de um satélite da Nasa.
– Que entidade?
– Para quê?
O máximo que retiro dele é o seu apelido: Neco. Na entrada do prédio, ele já começa desculpando a simplicidade da amostra:
– Conhecimento não ocupa espaço.
A força do acervo está em sua performance emocional. Ele dança, sapateia, grita. Não afirma nada, faz intrigas. Não para um minuto de contar histórias. Questiona ações governamentais no Caso Roswell, de 1947, onde um óvni teria caído no Novo México (EUA), e desenvolve criativas teorias de conspiração sobre o lado oculto da Lua e súbita interrupção das viagens espaciais americanas. Reedita o apresentador Jack Palance, do programa Acredite se Quiser. Roberta Ávila fica na retaguarda, colocando ao fundo canções de Frank Sinatra e Elvis Presley em momentos precisos da exposição.
A dupla escolheu Itaara pelo teto perfeito para observação astronômica. Em outubro, pretende inaugurar o Observatório Cosmos. Cerca de 15 escolas visitam mensalmente o museu, que concilia material de cosmologia e ufologia com paleontologia e arqueologia. As crianças se divertem com a explicação do Big Bang e da reconstituição do cenário pré-histórico. Podem tocar em cocô de dinossauro e manusear ossos de animais extintos.
– Para entender a vida extraterrestre, é necessário entender a evolução do homem – pontua Hernan.
Da origem do universo a casos clássicos de abdução, o professor vai assumindo um tom animado de Revolução Farroupilha. No final, ele se transforma em Jack Palance mais Bento Gonçalves. O Centro Victor Mostajo surge como o museu internacional mais bairrista do mundo.
– Os mais antigos dinossauros da Terra são gaúchos. E temos Artur Berlet, um tratorista de Sarandi que foi abduzido em 1958 por um disco voador, viveu nove dias no planeta Acart e antecipou experiências tecnológicas fora de série para a época, como comunicação via Skype em tela plana de plasma.
Acredite se quiser, tchê!
Publicado no jornal Zero Hora
Série semanal BELEZA INTERIOR
(Em todos sábados de 2011, apresentarei meu olhar diferenciado sobre as cidades, as pessoas e os costumes do RS)
p. 30, 30/7/2011
Porto Alegre, Edição N° 16777
Veja vídeos sobre nossa passagem pelo Museu de Ufologia