EFEITO COLATERAL DA MULHER ROMÂNTICA
Arte de Louis Boulanger
A mulher romântica tem um efeito colateral: não perdoa. Não perdoa mesmo.
Ela não esquecerá qualquer mancada que você tenha feito. Pode recorrer ao exorcismo, afogar Santo Antônio, investir o salário em macumba.
Nada apagará a ofensa de sua memória. Nada amansará sua dor.
O tempo não desgastará a mágoa, é tudo como se fosse ontem. Ou melhor, hoje de manhã.
Não existe atenuante, não existe a tecla Delete, não existe nem condenação a serviços comunitários.
A idealização, quando machucada, traz a intransigência. Não encontrará mais rascunhos na idealização.
A partilha, antes bênção dos elogios, será calvário das acusações.
Para a mulher romântica, a memória tem uma única vida, como o vestido de noiva. Não há maneira de reaproveitá-la.
Uma falsidade, ainda que eventual, tornará o resto inteiro falso, criando a suspeita do engano permanente.
Ela se lembrará da tristeza pela relação inteira. Sempre voltará ao assunto, sempre trará o ressentimento à baila.
A mácula se transformará num quartinho proibido e assombrado da convivência, a mancha fechará a porta da espontaneidade.
Você pensa que, por ser romântica, ela é tapada. Você pensa que, por ser romântica, ela é dependente e frágil. Você pensa que, por ser romântica, ela aceitará qualquer coisa. Você pensa que, por ser romântica, ela terá compaixão. Enganou-se redondamente.
Você confundiu romantismo com amor incondicional, este é o seu engano.
Toda mulher romântica, por mais que se esforce, jamais perdoa qualquer deslealdade ou infidelidade.
O homem pode se retratar diante da família e dos amigos, arrepender-se publicamente, rastejar no chão da cozinha, subir escadarias de joelhos, prometer ser perfeito dali por diante: não adianta.
Mulher romântica apenas é boa quando você não pisa na bola. Depois da falha, ela será um inferno.
Como ela é devota, sensível e dedicada, qualquer sofrimento pesa duas vezes mais. A ferida dói o dobro.
A mulher romântica não tolera mentira.
Desde o início da relação, só faz uma exigência: a sinceridade.
Quando quebrada a sinceridade, ela não acreditará mais.
O conto de fadas não tem como ser refeito. O encantamento some, e o poder das juras desaparece. É agora falar para o vento e viver casado com a tempestade.
Publicado no jornal Zero Hora
Porto Alegre (RS), Edição N°