FREUD E MELAINE KLEIN
O amigo Sandro tem um adorável casal de malteses brancos. Às vezes eu o visito para matar saudade de seus fiéis escudeiros. O latido deles é a campainha do apartamento. Cismo apenas com os nomes dos dois: Freud e Melaine Klein. Já critiquei abertamente meu camarada de sua grandiloquência enrustida. Não são mais cachorros, mas Wikipédia.
— Menos, Sandro, não mete os autores no meio! Por que não personagens? Quer mostrar erudição, então que tal Édipo e Electra, para contemplar nossos principais complexos?
Não adiantou, ficaram para sempre Freud e Melaine Klein.
Meu ponto de vista é de que podemos descobrir a pretensão de alguém pelo nome que dá aos seus cães. É onde enterra o osso de sua ambição, sob o disfarce de homenagem divertida.
Profetizo que Sandro chamará a primeira ninhada de Lacan e Winnicott. O que definirá o batismo não será determinado pela aparência e pela raça, e sim pela linha de atuação teórica do seu dono.
É evidente que meu amigo é psicanalista e ainda mostra que não deseja ser qualquer um, mas o profissional com o maior número de citações em pesquisas acadêmicas, o sucessor máximo dos principais baluartes de sua estante. Ele nunca admitiu a aspiração publicamente, diz que não chega nem aos pés de seus ídolos. A dupla de cães forma seu alter ego e contraria a falsa modéstia.
Sandro não fez isso com seu filho, que batizou de João. Um simples e eficiente João. Pode ser uma homenagem a João Gilberto ou João Cabral e tantos joões divinos que circulam pela posteridade da arte. Cuidou para manter o primeiro nome e não restringir o futuro colando o sobrenome de um artista famoso. Que terrível destino de um menino, cria de católicos fervorosos, nomeado de João Paulo Segundo. Terminar como papa, ok, mas nascer como papa é agouro.
Restou ao pequeno João a liberdade de ser outro João. Seu pai não foi soberbo, parou no pudor de cartório.
Já com os animais de estimação, Sandro extravasou a ração da vaidade. Além de roer as almofadas do divã, os coitados não têm como se defender.
O que tem de Beethoven, Shakira, Mandela, Napoleão e Michael Jackson passeando de coleira nos parques não é brincadeira. Onde está a simplicidade carinhosa do apelido, onde foram parar Totó, Mel, Bidu, Xodó, Rex?
As praças são manicômios de focinhos. Onde ninguém admite ser anônimo, todo mundo pretende ser celebridade por tabela. Estamos enlouquecendo os bichos.
O cachorro é o nosso melhor amigo, convém não abusar da lealdade.
Crônica publicada no site Vida Breve
— Menos, Sandro, não mete os autores no meio! Por que não personagens? Quer mostrar erudição, então que tal Édipo e Electra, para contemplar nossos principais complexos?
Não adiantou, ficaram para sempre Freud e Melaine Klein.
Meu ponto de vista é de que podemos descobrir a pretensão de alguém pelo nome que dá aos seus cães. É onde enterra o osso de sua ambição, sob o disfarce de homenagem divertida.
Profetizo que Sandro chamará a primeira ninhada de Lacan e Winnicott. O que definirá o batismo não será determinado pela aparência e pela raça, e sim pela linha de atuação teórica do seu dono.
É evidente que meu amigo é psicanalista e ainda mostra que não deseja ser qualquer um, mas o profissional com o maior número de citações em pesquisas acadêmicas, o sucessor máximo dos principais baluartes de sua estante. Ele nunca admitiu a aspiração publicamente, diz que não chega nem aos pés de seus ídolos. A dupla de cães forma seu alter ego e contraria a falsa modéstia.
Sandro não fez isso com seu filho, que batizou de João. Um simples e eficiente João. Pode ser uma homenagem a João Gilberto ou João Cabral e tantos joões divinos que circulam pela posteridade da arte. Cuidou para manter o primeiro nome e não restringir o futuro colando o sobrenome de um artista famoso. Que terrível destino de um menino, cria de católicos fervorosos, nomeado de João Paulo Segundo. Terminar como papa, ok, mas nascer como papa é agouro.
Restou ao pequeno João a liberdade de ser outro João. Seu pai não foi soberbo, parou no pudor de cartório.
Já com os animais de estimação, Sandro extravasou a ração da vaidade. Além de roer as almofadas do divã, os coitados não têm como se defender.
O que tem de Beethoven, Shakira, Mandela, Napoleão e Michael Jackson passeando de coleira nos parques não é brincadeira. Onde está a simplicidade carinhosa do apelido, onde foram parar Totó, Mel, Bidu, Xodó, Rex?
As praças são manicômios de focinhos. Onde ninguém admite ser anônimo, todo mundo pretende ser celebridade por tabela. Estamos enlouquecendo os bichos.
O cachorro é o nosso melhor amigo, convém não abusar da lealdade.
Crônica publicada no site Vida Breve