HARÉM DAS MARGARIDAS
Território de marmanjos: homens têm de se virar na arte da sedução. Foto de Emílio Pedroso
Se você, leitora, lamenta a estatística de duas mulheres para um homem no país...
Se você diz que é injusto que exista uma população feminina majoritária no RS de 51,5%...
Se você não aceita a média de 94,8 homens para cem mulheres no Estado...
Se você chora a diferença de quase 41 mil mulheres a mais, saiba que, em algum lugar do mundo, a vida é diferente.
Santa Margarida do Sul é o harém cobiçado em todo chá de panela. É o município gaúcho com a maior concentração de testosterona por metro quadrado (atrás somente de Charqueadas, que tem a liderança invalidada devido aos presídios masculinos).
A 292 quilômetros da Capital, a simpática cidadezinha de 2 mil habitantes apresenta 118 cavalheiros para cada grupo de cem moças. Andar em suas ruas de terra batida é o equivalente a percorrer os corredores de um internato rural.
– As mulheres estão em extinção na cidade – desabafa o industriário Elias Goulart Seixas, 53 anos.
– No restaurante, vejo apenas barbado palitando os dentes.
O território tem muitas peculiaridades: mulher entra de graça nas festas, macho paga o dobro; as fofocas são feitas pelos marmanjos; não se verá briga ou discussão de jovens por namorado.
– É uma situação confortável, sobra homem. Não puxamos os cabelos uma das outras, muito menos nos gastamos em intriga – afirma a bem-humorada Cinara Silveira, 49 anos.
Casada durante 23 anos, ela exemplifica a tranquilidade com a aproximação silenciosa que teve com o marido, Rubemar Faria.
– Foi um beijo de cara. O que faltava era o beijo. Depois do beijo, vieram todas as palavras – lembra.
Alegria delas, desconsolo deles. O domador de cavalos Douglas Steffen Machado, 19 anos, precisa viajar a São Gabriel para obter melhores resultados na arte da sedução. Cansou de ficar encalhado nas noites margaridenses.
– O ideal seria a prefeitura promover o turismo do amor, excursões de mulheres a nossa terra, para embelezar a cidade – inventa Machado.
O capataz Rodrigo Castanho Sachenave, 24 anos, também critica a falta de oportunidades de flerte:
– É uma solidão de laçador, recomendo treinar no espelho e não errar cantada.
A desproporção ajuda as mulheres a enfrentar preconceitos. Cristina Moraes Siqueiro, 22 anos, se apaixonou pelo pecuarista Adonai Lopes Lemos, 68 anos, que tem a idade de seu avô.
– O filho dele foi colega de escola do meu pai, entende? Tive liberdade para amá-lo sem ser criticada – lembra.
A vantagem numérica masculina alterou o quadro de aproximação entre os sexos. Com um maior número de opções, as mulheres é que tomam a iniciativa. A caça é o caçador, cumprindo a sociedade idealizada pelas feministas.
– As mulheres atacam, soltam seu charme, exercitam sua independência, não levam desaforo para casa, não esperam que ele se aproxime. Os sujeitos se encolhem nas cadeiras! – explica Viviane Goulart, 29 anos, funcionária da agência de Correios.
Sandra Martins, 31 anos, balconista de um posto de gasolina, concorda:
– Os solteiros têm medo de mim. Toda mulher que fala demais parece assanhada.
No Rio Grande do Sul, o casamenteiro Santo Antônio cedeu seu lugar no altar para Santa Margarida do Sul.
Publicado no jornal Zero Hora
Série semanal BELEZA INTERIOR
(Em todos sábados de 2011, apresentarei meu olhar diferenciado sobre as cidades, as pessoas e os costumes do RS)
p. 34, 02/04/2011
Porto Alegre, Edição N° 16658
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