HINO DA DESPEDIDA
Foto de Gilberto Perin
Para Roberta Campos
O altar está arruinado, não há recompensa depois de amar, todas as palavras foram usadas e as mentiras já são velhas, não me venha com promessas, só me deixe passar, com licença, só me deixe passar, quero ir sozinho assim como nasci. Nascerei de novo até cansar de morrer.
Seu olhar perdido não me trará a vontade de lembrar. Seu riso desajeitado não me despertará a ansiedade do abraço. Sou agora insensível às chantagens. Só me deixe passar, quero ir, com licença. Teve várias chances dentro de mim e pensou que eu não iria quebrar. Não tem problema, sou mais leve aos pedaços, não pagarei excesso de bagagem.
Deixe-me passar. Não é ficando na minha frente que mudará qualquer desejo. Não é retornando ao passado que consertará os erros.
O que não percebeu: o perdão era fácil e bastava a sinceridade, o perdão era simples e bastava a verdade, o perdão sempre esteve guardado no sotaque ingênuo da infância.
Não há curiosidade, não há esperança, não enxergo vontade de tentar em seu lugar fingindo que eu sou você. Não somos dois, não seremos um.
Cansei de explicar o que você jamais fez. Cansei de justificar sua ausência. Cansei de estar em dobro quando vinha pela metade. Deixe-me. Nem o sol é educado, a luz vive atravessando a chuva.
Com licença, rir é também chorar, rir é quando a boca chora. Apanhei do amor, mas fui eu que apanhei o amor.