Blog do Carpinejar

MEU SONHO DE CASAMENTO

Arte de Marc Chagall

Meu sonho é subir ao altar. E uma mulher alucinada gritar do fundo da igreja:
 
– Não, ele me pertence, eu ainda o amo.
 
Seria o máximo. O pianista buscaria despistar o pânico tocando Princesa Diana, de Elton John, haveria uma agitação febril no átrio, burburinho e gemidos frenéticos entre os convidados, o padre se manteria incrédulo, a noiva iria me fuzilar:
 
– Quem é ela?
 
Explicaria baixinho no ouvido que é uma antiga namorada sem importância.
 
Todos os olhos estariam voltados para minha boca, eu roubaria a cena. Finalmente veriam que meu terno preto era Armani, que custou tão caro quanto o véu e a grinalda.
 
Para manter o suspense, não responderia no ato, giraria o rosto indeciso para o lado esquerdo e direito, como torcedor em partida de tênis. Até emitir a sentença:
 
– Eu amo minha noiva. Você é passado. Some daqui!
 
Depois do susto, garantiríamos nosso futuro. Nenhum incidente poderia nos separar de novo.
 
Ela completaria bodas de ouro comigo, jamais cogitaria a distância, permaneceria fiel vida adentro.
 
Nada como o pânico para renovar os votos de felicidade. Nada como um dilema para fortalecer decisões.
 
A reconciliação necessita acontecer antes mesmo da briga. É o medo de perder o par que reforça nossa entrega.
 
Orgulharia sua família e amigos ao descartar publicamente uma rival, ao mandá-la embora desprovido de piedade.
 
Aquilo seria a maior prova de amor. Muito melhor do que ser casto em festa de solteiro.
 
Receberia a confiança eterna de sua aliança, a cumplicidade delicada de sua fé.
 
Mostraria que sou o tipo ideal, sério e devotado: não estraguei a festa, não humilhei seu vestido, venci as tentações egoístas.
 
Deveria existir um serviço para contratar “loucos da igreja”. Senhoritas e senhores, disponíveis em books nas agências de publicidade, preparados para protestar no casório.
 
Contidos no princípio da cerimônia, romperiam o corredor com estardalhaço na hora em que o padre falasse: “Se alguém tem algo contra este casamento, que diga agora ou cale-se para sempre”.
 
Assim como as carpideiras, recrutadas para chorar em velórios, formariam uma nova categoria profissional, um time de lindos modelos provocando ciúme no noivo e na noiva e apimentando o relacionamento.
 
Seriam atores e atrizes dramáticos e desesperados realizando uma intervenção amorosa e criando intrigas existenciais.
 
Todo não pede um sim. Todo governo requer oposição.
 
Casamento de sucesso depende de torcida contrária.
 
 



Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, p. 2, 16/10/2012
Porto Alegre (RS), Edição N° 17224

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