NÃO RASGO EMBALAGENS
Arte de Stefan Luchian
Tenho um amigo que se apaixonou por uma empacotadora.
Não, ele se apaixonou pela forma como a empacotadora embrulhava as compras para presente. O modo que desfiava o laço com a tesoura, que cortava o durex com os dentes, o carinho que dobrava o papel para dentro e para fora, a lentidão amorosa com algo que não era para ela. Nada de embalagens prontas, nada de saquinhos com cola e facilidades.
Desde que a viu, ele passou a comprar compulsivamente naquela loja. Comprava coisas desnecessárias. Comprava sem precisar de nada dali. Comprava presentes sem ter para quem entregar. Comprava para assistir o espetáculo daquelas unhas vermelhas realizando um curso de origami somente para ele. E os objetos adquiridos ficavam empilhados em sua casa, e não se importava com o desperdício de seu tempo e dinheiro: conhecia alguém que valorizava o capricho. Cuidava do mínimo, do pouco, da aparência, alguém que gostava daquilo que estava fazendo e que fazia com gosto.
Até hoje, quando recebo presentes, não rasgo a embalagem lembrando dessa história.
O que vai fora denuncia o que vai dentro.
O amor, seja profissional, seja pessoal, reside nos detalhes. É não somente mandar uma carta, mas escolher a cor do envelope. É não somente mandar flores, mas cuidar com o que vai escrito no cartãozinho. É não somente lembrar, é explicar o quanto o outro é importante.
Ouça meu comentário na manhã de sexta-feira (24/4), na Rádio Gaúcha, programa Gaúcha Hoje, apresentado por Antonio Carlos Macedo e Jocimar Farina: