NÃO TENHO ROUPA
Arte de Eduardo Nasi
Mulher apaixonada vem para matar no primeiro encontro.
O investimento para aquela noite traduz o interesse que tem por você.
Quando ela se produz é que alimenta a maior curiosidade, deseja prender sua atenção, não pretende lutar apenas para não ser rebaixada e se manter na série A, mas busca o título e persegue a invencibilidade.
Se ela comprou todo o figurino novo, aceite que será devastado, arrasado, esquecerá quem foi um dia. É a mulher apagão.
Se ela ainda tem o requinte de vir de salto alto, não tente ganhá-la na conversa, ela que vai levá-lo para onde quiser. É a mulher orgasmo múltiplo.
Mulher demonstra arrebatamento falindo de véspera: horas no salão, horas nos provadores das lojas. Ela não se preparou, ela se inventou totalmente.
Só deixará você pagar a conta do restaurante porque seu cartão de crédito nem vai passar de tanto que gastou.
Ela contraiu dívidas inimagináveis nem tendo a certeza que era para o homem certo. Seguiu a intuição, não facilitou para o destino.
Você acha que ela demorou a agendar um encontro, pois planejou para dois dias dali? Que ela não tem pressa de vê-lo? Que não tem urgência? Enganou-se, ela precisa de 48 horas para nascer de novo.
Protelar o primeiro encontro para a mulher é sinal promissor. Ela necessita se armar, solicitará ajuda para as amigas, criará a expectativa, derrubará seu guarda-roupa, providenciará caixas de velharias para campanha de agasalho.
É um suspense que aumenta a atenção, que gera ansiedade e taquicardia.
Quando uma mulher está interessada em alguém, sua questão existencial imediata não é seduzir, é se desesperar: — Não tenho roupa, e agora? Porque ela sempre achará que não tem roupa quando está perto de um novo romance.
Mulher não busca corresponder às expectativas, isso é coisa de homem!, mulher busca superar as expectativas.
O primeiro encontro dita sua vontade de relacionamento, sua predisposição em prolongar a madrugada ou abreviá-la. Pode até recorrer à uma combinação seminova, o que não significará falta de esperança: adotou uma aparência que inspira confiança.
A roupa diz tudo: vestido é para epopeias, saia é para dramas intimistas, leggings é para comédias românticas.
Se não está usando sutiã, é ousada, desencadeando um strip para a imaginação.
Se mostra as costas, anseia ser beijada de surpresa, assaltada no pescoço pelo passeio dos lábios.
Não alimente falsas esperanças. Mulher não vem à toa no primeiro encontro. Chegará atrasada como uma noiva para que a veja entrando. Para que a veja causando entre as outras mesas. Para que guarde essa imagem de altar no inconsciente. A inveja é a madrinha do amor.
Já quem chega antes não dá muita abertura, está relaxada e fazendo tempo. Fará tempo também com você.
Caso ela apareça sem brincos, sem colar, sem pulseiras, não está muito disposta. Nem pense em transar depois. No máximo, receberá um selinho para correspondência platônica.
Se ela aparece desarrumada ou básica, peça a conta. Ela somente lhe enxerga como amigo.
Se ela surgir de macacão jeans de pintor de parede, por Deus, é um cinto de castidade, a curva do corpo some, não há brilho de estreia, não existe provocação, e sim desleixo. Atravessará a madrugada descrevendo antigos amores e reivindicando conselhos. Ela nem lhe enxerga como amigo, mas pior: como confidente.
Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira
12/11/2014