O AMOR DEPOIS DO DIVÓRCIO
Arte Fatturi
Os promotores de justiça sabem. Os juízes sabem. Os terapeutas sabem. Os massoterapeutas sabem. As faxineiras sabem.
Nunca houve tanta reconciliação. Mais do que casamento e divórcio.
A reconciliação é o amor autêntico. O amor bandido que se converteu à lei. O amor bêbado que largou o álcool. O amor drogado que fugiu dos vícios.
A reconciliação é o amor depois das férias, recuperado da perseguição dos defeitos e da distorção das conversas.
É o amor depois da mentira, depois do tribunal, depois da maldade da sinceridade, depois da carência.
Casais que se prometeram o inferno, que disputaram a guarda na Justiça, que enlouqueceram os filhos com suas conspirações, decidem voltar a morar junto, para temor dos vizinhos, para o susto da parentada.
A reconciliação é uma moda entre os divorciados.
Mal se acostumam com o nome de solteiro e se envolvem com os mesmos parceiros. Mas os mesmos parceiros são outros. Outros novos.
A distância elimina a culpa. A falta filtra a cobrança.
Eles experimentaram um tempo sozinhos para descobrir que se matavam por uma idealização.
Enfrentaram relacionamentos diferentes, exageros e excessos, contemporizaram os medos e as rejeições, provaram de frustrações amorosas.
Viram que o príncipe se vestia mal, e o sapo coaxava bonito.
Viram que não existe demônio ou santo no amor. Não existe certo ou errado, existe o amor e ponto.
Este amor provisório, inconstante, inacabado e vivo.
Este amor pano de prato, não toalha de mesa, mas que serve para secar a louça e as lágrimas.
Quem era ciumento retorna equilibrado, quem era indiferente regressa atento.
A trégua salva e refina o comportamento. O casal passa a adotar no dia-a-dia aquilo que não admitia fazer e que o outro recomendava.
O que soava como crítica antigamente passa a ser conselho.
Gordos emagrecem com exercícios físicos, brabos examinam seus ataques de fúria.
A saudade era um recalque e se transforma em sabedoria.
O par percebe que é melhor ser inexato do que inexistente.
Durante a separação, ninguém aceita ressalva e exame de consciência.
A separação é soberba, escandalosa, arrogante. Todos gritam e espalham os motivos da discórdia.
Já a reconciliação é humilde, ouvinte, discreta. Os amantes cochicham juras e esquecem as falhas. Baixam as exigências para aperfeiçoar o entendimento.
A reconciliação é o amor maduro, o amor que ressuscitou, o amor que desistiu de brigar por besteiras e intrigas.
O amor que é mão dada entre o erro e o perdão. Mas que agora pretende envelhecer de mãos dadas para sempre.
Publicado no jornal Zero HoraColuna semanal, Revista Donna, p. 6
Porto Alegre (RS), 17/03/2013 Edição N° 17374