O BANDIDO DA CALÇA VERMELHA
O garçom pode destruir a vida amorosa de um homem. É ignorar nosso dedo que começa o martírio diante da mulher. Na primeira recusa, fazemos uma piadinha sem graça tipo “ele quer que a gente fique mais tempo no restaurante”. Mas a desatenção abala a confiança. Não temos certeza se levantamos a segunda vez, o estoque de piadas é limitado. Alçamos o indicador e ele repete o desdém. Vira para o outro lado no instante exato do gesto. A namorada desliza a uma compaixão perigosa, próxima da decepção. Tento reverter com outro gracejo: “Está vazio mesmo, estamos fazendo número para chamar clientes”. Ela ri somente com as covinhas, enterrando devagar minha reputação. A terceira insistência é a mais complicada. Se errar, não tem volta, é como senha de banco. Daí ergo o punho, grito “ó amigo” e assobio, aperto a cartela de botões do playstation para destruir o inimigo. Ele vem com uma ingenuidade de quem chegou agora no mundo, disfarçando que não me viu antes. Com aqueles olhos pela metade de passarinho nascendo. Meio pálpebra, meio pupila.
Por certo, as professoras me acostumaram mal. O garçom é uma represália adulta ao magistério. Nas aulas, um simples movimento de espreguiçamento ou uma coceira na cabeça e a professora antevia uma pergunta. Fui mimado quando criança.
Talvez a mais sórdida humilhação seja o desprezo de um ônibus. Porque estamos na parada com a convicção de que ele vai parar. Quando passa reto, levamos para o lado pessoal. Há sempre nossa corridinha que aumenta o vexame. Não existe modo de disfarçá-la.
Mas ser desdenhado por um táxi já produz estrago. Não é mais um restaurante, ou uma parada que assiste, é a rua inteira. Deixei a Escola de Design da Unisinos para a Nilo, avenida com maiores possibilidades de embarque. Até que me apareceu um veículo laranja enquanto caminhava. Que sorte. Soltei um berro de boiadeiro. O táxi manteve sua velocidade. Os pedreiros prontificaram a me ajudar e gritaram comigo. Andaimes de vogais: Ei Oi Ei Oi. Um sujeito que mijava numa árvore virou o pescoço em solidariedade. A esperança é que o carro estacionou na esquina — descia uma jovem. Esperneei em sua direção, alterado, balançando a mochila e a bolsa.
Todo magro tem um barítono escondido em si. A antiga passageira avisaria o motorista. Expulsei a ópera:
— Segura para mim! Segura!
A adolescente me observou de relance e tremeu, como se eu fosse um assaltante. Antecipou o perigo da abordagem. Meu desespero não tinha aparência de boa notícia. Poderia ser a minha calça vermelha ou a camiseta com uma puta da Rua Augusta, a questão é que ela tocou no capô com dois toques para que fosse embora, avisando do perigo e atravessou a calçada aos pulos. O segurança do prédio desceu as escadas para me intimidar.
— O que queria com a menina?
— Aquele táxi…
Paguei bandeira dois ao mico.
Por certo, as professoras me acostumaram mal. O garçom é uma represália adulta ao magistério. Nas aulas, um simples movimento de espreguiçamento ou uma coceira na cabeça e a professora antevia uma pergunta. Fui mimado quando criança.
Talvez a mais sórdida humilhação seja o desprezo de um ônibus. Porque estamos na parada com a convicção de que ele vai parar. Quando passa reto, levamos para o lado pessoal. Há sempre nossa corridinha que aumenta o vexame. Não existe modo de disfarçá-la.
Mas ser desdenhado por um táxi já produz estrago. Não é mais um restaurante, ou uma parada que assiste, é a rua inteira. Deixei a Escola de Design da Unisinos para a Nilo, avenida com maiores possibilidades de embarque. Até que me apareceu um veículo laranja enquanto caminhava. Que sorte. Soltei um berro de boiadeiro. O táxi manteve sua velocidade. Os pedreiros prontificaram a me ajudar e gritaram comigo. Andaimes de vogais: Ei Oi Ei Oi. Um sujeito que mijava numa árvore virou o pescoço em solidariedade. A esperança é que o carro estacionou na esquina — descia uma jovem. Esperneei em sua direção, alterado, balançando a mochila e a bolsa.
Todo magro tem um barítono escondido em si. A antiga passageira avisaria o motorista. Expulsei a ópera:
— Segura para mim! Segura!
A adolescente me observou de relance e tremeu, como se eu fosse um assaltante. Antecipou o perigo da abordagem. Meu desespero não tinha aparência de boa notícia. Poderia ser a minha calça vermelha ou a camiseta com uma puta da Rua Augusta, a questão é que ela tocou no capô com dois toques para que fosse embora, avisando do perigo e atravessou a calçada aos pulos. O segurança do prédio desceu as escadas para me intimidar.
— O que queria com a menina?
— Aquele táxi…
Paguei bandeira dois ao mico.
Crônica publicada no site Vida Breve