O MAIOR PRÊMIO DO AMOR
Arte de Eduardo Nasi
O que é mais complicado: uma entrevista de emprego ou uma conversa de reconciliação?
Em ambas, temos que cuidar de cada palavra, conter a prepotência, esconder o ressentimento, é preciso ter esperança e fé na medida certa, e apresentar sobriedade e segurança nos gestos e nas atitudes.
O correto é responder somente o que foi perguntado, com clareza e convicção. Não é recomendado falar demais, o que pode despertar assuntos incômodos, e tampouco falar de menos, capaz de transmitir indiferença.
As duas situações são muito idênticas, paradoxalmente semelhantes. São avaliações de nosso temperamento. Um lapso pode indicar a perda da vaga ou o desmoronamento do sonho.
No recrutamento profissional, é abusar do riso que entregamos o nervosismo e caímos no terreno do deboche. Na reconquista amorosa, é uma frase equivocada e todas as brigas e desentendimentos voltam com força total.
São negociações de alto risco, mas considero a reconciliação como a mais tensa e delicada.
Porque na entrevista de emprego, seremos contratados pela primeira vez. Existe um desconhecimento otimista de nosso passado, um voto de confiança. Contamos com cartas de recomendação e um currículo resumido. O que prevalece é a vontade de trabalhar.
Já na volta afetiva estamos sendo recontratados. Não há nenhuma indicação de terceiros, nem a mínima possibilidade de mentir. O outro nos conhece e não tem como enganar. Não há modo de disfarçar nossos problemas e defeitos. Não somos flores perfumadas. O único caminho viável é o da sinceridade. Convencer nossa companhia de que, na soma de erros e acertos, acertamos mais. É uma avaliação do legado, acima dos prognósticos.
Se o motivo da separação foi infidelidade e deslealdade, não tente dividir a culpa. Assuma sozinho o peso das falhas. Se o motivo da separação é estresse e desgaste, o ideal é usar o nós no discurso e repartir a responsabilidade.
Quem busca ter vantagem na discussão acaba reabrindo as feridas e pisando em ovos. Procurar culpados não adianta nada, ainda é se omitir. O que desarma a raiva é se importar com o sofrimento de nossa companhia e valorizar a construção a dois (os fracassos e sucessos).
É o momento de humildade generosa: eu também errei, fui imaturo, desculpa por tudo o que magoei.
Há duas operações fundamentais que não podem faltar: ouvir sem interromper e falar pausadamente não fazendo brincadeiras.
Preparar-se para reatar os laços deve ser levada a sério como uma seleção de Recursos Humanos. É o equivalente a um concurso público. Preocupados em resolver logo a pendência sentimental, esquecemos nossas condições físicas e psicológicas.
Antes do acerto de contas, durma oito horas, converse com os amigos, alimente-se direito. Marque em um lugar neutro para conter a passionalidade e o extremismo e evitar os gritos e as ofensas. Vista roupas leves e confortáveis, leve a garrafinha d’água e esteja disposto a atravessar longas horas quebrando a cabeça e resolvendo cálculos metafísicos. Não dá para chegar cansado e com fome, que somente trará intolerância, imposição e impaciência. O desastre é resultado do descuido. Na grande parte das vezes, o conflito vem da exaustão emocional: a vontade de acabar o sofrimento de qualquer jeito, mesmo que seja do pior jeito.
O esforço compensa. Ser chamado de volta é o maior prêmio do amor. Maior do que a sedução.
Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira
08/10/2014