O MEDO DA MATERNIDADE
Fabrício Carpinejar
Foto de Gilberto Perin
Tenho amigas que escolheram não ter filhos. Escolheram. Não queriam mesmo. Elegeram como objetivo viajar ou namorar ou se dedicar ao trabalho. Venceram o preconceito de que seriam menos mulheres sem a maternidade. São felizes dentro de sua autonomia de viver e não serão chamadas de tias solteironas.
Não há mais a corrida pela forca da maternidade com a chegada dos 40 anos. É uma opção, não uma obrigação social, não um condicionamento ideológico. Supera-se cada vez mais o entendimento restritivo da mulher como progenitora.
Para as mulheres que desejam um filho, a dificuldade maior não é a criança, ainda que conte sempre com a chance da produção independente. É o medo de não encontrar um pai decente para a criança. Um homem que realmente seja fruto do amor e que siga lhe respeitando ainda que não esteja mais junto depois da relação. O medo é criar laços com alguém que não pretende nunca mais ver na frente.
O medo é acabar o romance e não sobrar nem o amigo para dividir a responsabilidade pela educação. É terminar o encantamento e não sobreviver nem a serenidade do respeito, a ponderação do cuidado, a reverência pela fragilidade da infância. O medo é o íntimo virar estranho e o estranho virar aspereza.
O medo é ser refém de um desequilibrado ou de um indiferente, após uma paixão repentina e absolutamente ilusória. E descobrir tarde demais que não existe compatibilidade intelectual, amorosa e de princípios.
O medo é que o filho experimente um pai ausente, um pai burocrático, um pai que não mexerá uma vírgula de sua pensão, que reduzirá a possível cumplicidade a visitas esporádicas e hostis.
O medo é se relacionar eternamente com uma pai feito de papel, nunca de atitude, um pai biológico, que não é espiritual, um pai com uma ligação sanguínea e jamais cardíaca.
O medo é dar uma maternidade atenta e generosa ao filho, mas passar o tempo inteiro tentando diminuir os danos de uma paternidade problemática e traumática do outro lado.
O medo é amparar a solidão da noite do aniversário de sua criança e explicar o inexplicável motivo daquele pai não telefonar ou não procurar em data tão importante.
O medo é ser condenada a conviver com as ameaças de processos de guarda do filho por teimosia ou vingança.
O medo é suportar caprichos e desmandos da família paterna, buscando interferir na educação sem a contrapartida da oferta de nenhuma ajuda e apoio.
O complicado de ser mãe é definir um bom pai. O bom pai dura a vida inteira, muito diferente de um marido que pode durar até onde a razão aguentar.
Publicado no Blog de Fabrício Carpinejar do Jornal O Globo
12.05.2016