SHIMEJI OU SHITAKE?
Quando abrimos o cardápio de um novo restaurante japonês, eu e minha esposa não lembramos se gostamos de shimeji ou shitake. Como que esquecemos de novo? Paramos com o dedo entre as duas porções de cogumelos. Qual será mesmo a de nossa preferência? Shimeji ou shitake na manteiga?Sofremos de um lapso mútuo, de um Alzheimer amoroso. E vacilamos o pêndulo da mão diante dos números dos pratos.
- Não acredito que não me lembro, diz Beatriz.
- Não acredito que também não me lembro, respondo.
Já comemos dezenas de vezes. É, inclusive, um de nossos menus prediletos, ao lado do carpaccio de salmão, do guioza e do sashimi.
Porém, há um bloqueio inexplicável de nossa parte. Não guardamos os dados. Somos um Google offline naquela hora.
Coisa estranha. Raciocinando em perspectiva, não é um fato isolado. Existem lembranças que não se fixam por algum motivo inaudito. Registros impossíveis de se decorar. Pode ser um telefone discado com frequência que não entra na cabeça de jeito nenhum. Pode ser o nome de uma cidade recorrente que escapa das sinapses.
Surpreendente é o esquecimento mútuo, o esquecimento sincrônico, eu e ela repetindo a dúvida pela enésima oportunidade.
Chamamos sempre o garçom para esclarecer o dilema.
- Qual dos dois é o menor?, questionamos.
- O shimeji, o garçom explica.
- Queremos o shimeji!, exclamamos em uníssono.
Batemos palmas, gritamos gol, festejamos com beijos. O atendente deve se espantar com o nosso contentamento, exagerado para uma informação trivial.
É que o alívio dá realmente um barato próximo da droga - assim como espirrar é bom, por mais desagradável e barulhento que seja.
Desobrigar o cérebro a mais uma tarefa traz leveza e picos de endorfina.
Rimos sem parar dali por diante, nunca duvidando de que o nosso amor é o grande. A gente nunca erra esse pedido.
Publicado em Donna ZH em 15/10/2017