SIEDSCHLAG
Você ouve com as pálpebras.
As pálpebras são as unhas dos seus olhos,
pintadas de azul, laranja, preto.
Marcamos de nos ver no alto
do Teatro Municipal,
a meio caminho
entre a comédia
e a ópera.
Seu rosto tremia suavemente
com o ritmo do Viaduto do Chá.
A pressão sanguínea dos passos
na pele, a vibração envenenando.
Os passantes reverberavam
em seu corpo sestroso,
em seus seios fartos,
em suas ancas deliciosas.
A cidade ondulava no vestido.
Você segurava na barra da grade
e oferecia o pescoço
à mordida do vento.
Belvedere:
como se houvesse um mar,
como se houvesse uma serra.
Escorada no parapeito,
seus olhos fecharam
como um longo beijo
na boca do precipício
de São Paulo.
Assim que eu lhe vi
pela primeira vez,
fez cena de ciúme
com as pedras.
Todo viaduto é um amante
apressando o abraço.
Poema publicado no caderno Metrópole
Contracapa, C8, homenagem aos 120 anos do Viaduto do Chá
O Estado de São Paulo
São Paulo (SP), 11/11/12