SIRVAM NOSSAS FAÇANHAS DE MODELO A TODA TERRA
Arte de Eduardo Nasi
O gaúcho é o único terrorista autorizado. O único terrorista aceito pela ONU. O único terrorista sociável. O único terrorista de cara lavada e CPF desimpedido. O único terrorista que não é obrigado a se esconder, muito menos negar sua origem.
O único terrorista que é incentivado a abrir células — CTGs — em tudo que é parte do planeta, até no Japão, e não ser malvisto, fichado, perseguido.
Ele espalha sua crença, suas convicções, com imensa alegria. Nas escolas, nas creches, nos hospitais. Não tem nenhuma necessidade de deixar a barba crescer, falsificar passaportes, usar disfarces e fazer plástica.
O gaúcho é o único terrorista livre do mundo.
Pode erigir estátuas homenageando seus líderes, pavimentar ruas destacando seus guerreiros.
Pode soltar apelos de guerra em praça pública com direito a banda e microfone: “Não podemos se entregar pros home / Mas de jeito nenhum amigo e companheiro / Não tá morto quem luta e quem peleia”.
O gaúcho pode, inclusive, andar estranho, de pilcha e bombacha, e não ser discriminado.
É o único que pode gritar o hino no estádio e não ser chamado de separatista.
É o único que comemora o início da revolução, não o fim da revolução, e não ser visto como insurgente pelo resto do país.
É o único que pode declamar versos chulos, e jamais ser identificado como tarado e bagaceiro.
No fim das contas, o gaúcho é o único que pode entrar num avião com bomba e erva e não sofrer represália. Alguém mais pode?
Ninguém!, só o gaúcho desfruta desse privilégio.
E não será barrado no detector de metal e na alfândega.
E não será encaminhado para interrogatório em sala fechada.
E não será preso por alguma autoridade.
E não será extraditado.
Ainda receberá cumprimentos e apoio dos guardas, do comandante, das aeromoças, dos passageiros. Terá a simpatia bondosa das crianças, a curiosidade carente dos velhos.
Na aeronave, é capaz de desentupir a bomba com a maior tranquilidade, na frente de todos, sem suar frio ou se recolher ao banheiro.
É capaz de desempacotar a erva, soprar os farelos e sugá-la com a serenidade lenta de seu pulmão.
O gaúcho é o sonho de civilização de qualquer terrorista.
Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira