SUJOS E MALVADOS
Arte: Eduardo Nasi
Mulher toma banho mais vezes que o homem. Não neurotiza o gesto, simples e prático como pentear os cabelos ou se olhar no espelho.
Já o homem complica. Quando casa, volta à infância e retoma a sua mania de economizar a pele. Cabula o máximo possível, como se estivesse na estação da Antártida. Adia, finge que não é com ele, partidário da água como urgência para sair ou honrar algum compromisso profissional. Não difere do tempo de pequeno, quando escondia os pés sujos da mãe para dormir em paz, sem o pedágio do chuveiro.
A mulher é limpinha, obcecada em se lavar mesmo quando não é necessário. O homem compra briga mesmo quando é necessário.
Dificilmente a mulher virá para o sexo antes de um toque de higiene. Sempre dá uma conferida no banheiro. Renova o perfume. Ajeita a sensualidade da roupa. Coloca um jato de água nas partes pudendas. Prepara-se para a dança dos corpos nos lençóis. Preocupa-se realmente com o seu estado.
Em contraste, o homem passa reto. Vai direto para a travas. Crê que não depende de nada, de nenhuma flor na lapela do peito, porque defende o cheiro natural. Defender o cheiro natural é defender somente a sua preguiça ancestral. A mulher que se vire. O desleixo sempre foi machismo.
A questão é que nem sofre pois jamais se habituou a se cuidar para o outro, ou agradar ao outro. Confia que quem gosta dele tem que aceitar do jeito que ele é. Mesmo que seja estilo mecânico depois do serviço. Entende a graxa como a sua graça.
Comete o engano de desprezar o detalhe. Está com o desodorante vencido, suado e cavernoso e não vê nenhum mal nisso. Acha que é um gato e um banho de língua resolve. Mas não com a sua língua, claro. Não há Halls no mundo que disfarce o odor de xixi.
Publicado em Vida Breve em 09/08/17