UMA CASA NO CAMPO
Arte de Eduardo Nasi
Depois da liberdade sexual dos anos 60, estamos atingindo o tédio sexual. Nunca foi tão fácil transar. É um clique e temos à disposição em aplicativos pessoas interessadas e próximas.
Na web, há um acervo que poderia entreter os mais maníacos. Casas de swing são práticas corriqueiras. Nas baladas, é natural se envolver sem falar o nome. Hoje Édipo nunca saberia que estava se relacionando com sua mãe Jocasta.
Passará vergonha se não guarda chicote, venda, algemas e vibradores no criado-mundo. A privacidade é pública e ninguém mais se escandaliza com nada.
Perdeu a graça dizer expressões safadas no ouvido da mulher. Vadia, puta e cadela formam um repertório inofensivo. Não produz mais cócegas na imaginação. A imoralidade não desencadeia fantasias.
Somos meros animais satisfazendo as suas necessidades mais básicas. Não pensamos o sexo, renunciamos a elaboração de segredos e mistérios.
O que deve acontecer é uma volta ao conservadorismo. Logo mais nos comoveremos com as canelas e os cotovelos. Alimentaremos devaneios com a penugem loira dos braços, ou com a nuca arrepiada.
O que nos restará na cama é retornar ao romantismo, à poesia, às juras de vida a dois, ao cavalheirismo.
Como o erotismo representa a quebra do lugar-comum, a tendência é procurar o oposto dos nossos dias explícitos.
A atração estará residindo na intimidade. O respeito substituirá a falta de pudor.
“Com licença” e “por favor” servirão de preliminares.
Pornografia não seduzirá como antes. O que fará o outro gozar será a promessa de filhos.
- Me engravida!
O compromisso que assustava antes na cama poderá excitar. Verbalizar o desejo de uma casa no campo ou de uma velhice juntos apressará o prazer.
A monogamia dominará o discurso na cama.
- Você é só meu, não transarei com mais ninguém.
A brancura dos lençóis será o equivalente a de um altar.
- Me dê um filho!
E o homem não irá broxar. Pelo contrário, ele se enxergará eleito, exclusivo, único. A perspectiva de ser pai redobrará os seus movimentos.
Já vejo o apelo crescendo até o orgasmo:
- Me dê gêmeos!
- Me dê trigêmeos!
- Me dê quadrigêmeos!
E ambos soltarão gemidos ensandecidos e gritos sonhando com a residência cheia, de cercas brancas e jardim podado.
Crônica publicada no site Vida Breve
Colunista de quarta-feira 02/09/2015