Blog do Carpinejar

A MESA DE SINUCA

Às vezes é melhor não ter.

Eu alimentava uma inveja monstruosa do meu amigo Rodrigo. Ele ostenta uma mesa de sinuca no centro da sala. Em primeiro lugar, meu olho gordo se destinava ao poder de negociador dentro do casamento. Como ele conseguiu convencer a sua mulher a ter uma mesa de sinuca no meio da sala? A minha esposa jamais aceitaria. Ela era capaz de sentenciar: ou ela ou eu. Nem com todo o poder de sedução sequer traria uma mesa de Fla-Flu, o pônei da mesa acavalada de sinuca.

O ciúme crescia porque a mesa era vermelha, não verde, o que a diferenciava ainda mais dos lares de nós, mortais.

Eu babava de ódio. Durante os campeonatos, ainda sofria com os tacos novos, o giz recém comprado e um quadro para marcar a pontuação. O cara contava com um snooker bar em sua residência, com o bônus de não pagar qualquer consumação. As cervejas vinham geladas, a música ambiente estava na frequência exata do rock e havia independência para arrastar a conversa e as tacadas até de madrugada. Que vida perfeita, suspirava.

Mas, entre uma partida e outra, Rodrigo desabafou, para o meu completo espanto:

- A pior coisa que fiz foi ter comprado essa mesa de sinuca.

Não entendi. Achei que estivesse esnobando, sendo irônico, tirando vantagem. Só que não. Falava sério, condoído.

- Ela tem algum problema?
- Não, ela está ok. O problema é que ninguém valoriza as minhas vitórias. Tenho obrigação de ser invencível. Não há graça nenhuma.

Acabei aceitando os seus argumentos. Quando ele ganhava, o adversário virava as costas e fazia pouco caso de seu desempenho: você tem uma mesa para praticar todo o dia. Quando ele perdia, o adversário debochava de seu fracasso: mesmo com você praticando todo o dia, não me venceu, é muito ruim.

Eu cogitei pedir a mesa para mim e salvá-lo do martírio, acho que poderia convencer a esposa alegando loucamente que combinaria com os quadros do nosso apartamento, porém preferi continuar vencendo fora de casa, o gosto da vitória é dobrado. Não pude controlar: a inveja logo se transformou em arrogância.

Publicado em Donna ZH em 18/2/2012

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