GENE KELLY
Arte de John Tunnard
O carregador do celular é o novo guarda-chuva.
Antes o que mais perdia na vida era guarda-chuva. Devo ter extraviado mais de quarenta ao longo da vida, numa média de um por ano. Mudava o tempo, desaparecia a água das nuvens, e o deixava no restaurante, no ônibus, na escola, na universidade, no consultório. Lembrava somente dele na hora de sair para a rua no próximo temporal. Cansei de comprar, de roubar dos outros, e me molho de propósito, sou o Gene Kelly das poças gaúchas.
Agora sofro da maldição do carregador. Por mais que me concentre, esqueço no aeroporto, na casa de amigos, no trabalho, no bar. Como a bateria dura pouco e o celular centraliza o e-mail, as redes sociais e os contatos profissionais, sou obrigado a adquirir mais um carregador antes de recuperar o antigo de volta. Não há tempo hábil para o resgate.
O carregador é infiel como o guarda-chuva. Vive me trocando. Ele me abandona sempre para ficar beijando a tomada.
Ouça comentário na manhã dessa terça-feira (6/10), na Rádio Gaúcha, programa Gaúcha Hoje, com Antônio Carlos Macedo e Jocimar Farina: