Blog do Carpinejar

MEUS NAMOROS DURAM APENAS DOIS ANOS, É MALDIÇÃO?

Arte de Cínthya Verri

“Fisioterapeuta, 32 anos, moro com meus pais, o que me deixa incomodada. Sou de aquário, vivo de amor: pelo próximo, pelos amigos, pais, namorados... Dizer que meus namoros não dão certo é mentira, mas eles nunca passam de dois anos! Sou carente, vivo à procura ou à espera de um grande amor. Josi”.

Querida Josi,

Morar com os pais infantiliza seus namoros – este é o seu grande problema.

Ainda pede permissão, no inconsciente, para a família. Não tem atmosfera para expor as frustrações e os desejos súbitos, uma sala com sua decoração e modos, para se apresentar inteiramente. Um lugar para amar com liberdade e até brigar. Brigas sufocadas aniquilam o relacionamento mais do que as declaradas.

Todo instante requer delicada diplomacia para agradar os parentes e, ao mesmo tempo, demonstrar arrebatamento nas histórias particulares. Servir o passado e o futuro é impossível – cabe escolher seu destino.

A família sempre está perto olhando seus passos, analisando quem chega. Sua residência é superpovoada de curiosidade, quase uma romaria a uma santa, idêntica a uma torre de Rapunzel, cheia de provas e desafios.

Jogue-me suas tranças, Josi. Ou apague as velas do bolo. Está próxima de realizar o sonho da Disney, não da festa de casamento, compreende?

Seu espaço afetivo é um cativeiro de virtudes, limitado para sua idade. Vive questionada, e deve aceitar a invasão familiar nos seus assuntos porque não resta outra opção. Não há namoro que perdure. Os companheiros aguentam os dois anos do estágio probatório da paixão. E, pelo jeito, são bem esforçados e aplicados. Mas terminam obrigados a conviver com sogro e sogra. Não enxergam perspectiva de emancipação. Temem que o relacionamento seja a sombra eterna de uma mesada.

Você coloca sua felicidade nas mãos paterna e materna. Não procura o amor, espera um amor. Não pretende nem sair de casa. É muita moleza.

Que tal tirar seu título amoroso e votar em seu próprio candidato?

Abraço com toda ternura,
Fabrício Carpinejar

Querida Josi,

Era uma vez um viajante que, por acidente, sentou para repousar embaixo de Kalpataru, a árvore dos desejos. E estava com fome, por isso pensou: “Como eu queria comer!”.

No momento em que a ideia de comida surgiu na mente dele, o alimento imediatamente apareceu, e o homem estava tão faminto que nem pensou a respeito. Comeu tudo. Então sentiu sono.

Quando deitou na grama, o pensamento surgiu: “O que está acontecendo? Não vejo ninguém aqui. A comida simplesmente apareceu - talvez haja fantasmas fazendo isso comigo!”.

De repente, apareceram fantasmas. Ele ficou com medo e pensou: “Agora eles vão me matar!”. E eles o mataram.

Josi, talvez você veja aquilo que pensa. E, por isso mesmo, talvez seja o que faz acontecer.

Você tem grande percepção sobre o que precisa fazer para interromper o ciclo, mas não age. Afirma que percebe abandonar as próprias necessidades e deixá-las para o outro se responsabilizar sabendo que isso não funciona.

O amor não é feliz. O amor é o amor: uma geografia complicada, desordenada e que não obedece a comandos. Não tem data de validade, não tem período de expiração. É um terreno duro, que exige conversa e recuperação todos os dias.

O amor aposta no resgate, não tem nenhuma sobrevida. É um paciente terminal, um corpo dependente de cuidados para suas atividades mais corriqueiras. Ele não anda sozinho.

Viver junto com alguém não é esporte: é fisioterapia. Todo cuidado é pouco. Qualquer movimento brusco e perderemos todo o trabalho de meses. Amar é para artesãos.

Você já sabe cuidar de seus amores mais autônomos. Se quiser mais, será preciso deixar os pensamentos de lado e cumprir com o que você sente.

Beijos meus e coragem sempre,
Cinthya Verri


Publicado no jornal Zero Hora
Coluna semanal, Caderno Donna, p. 6
Porto Alegre (RS), 08/07/2012 Edição N° 17124

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